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Foto do escritorJoão Theodoro

O Que Aprendi Jogando Race.io

Atualizado: 9 de mar. de 2023




Assim como se vive, se joga. Se na vida você é agressivo, competitivo e ansioso, é assim que você será jogando, porque em tudo o que você faz há você. Um ovo que você frita, um café que você passa, tudo tem a sua marca, o seu DNA.


Foi em 2019 que eu joguei Race.io pela primeira vez, e adorei.


É um jogo 2D de corrida, simplíssimo, em que o único comando é tocar a tela para acelerar e fazer o veículo rodopiar enquanto voa depois de passar por uma rampa para pegar nitro. Mas é preciso controlar bem o dedo, para que o veículo não caia de costas e tenha de voltar um pouco, perdendo colocação. É também preciso ficar atento a como aterrissar, pois a depender da forma como se cai perde-se velocidade. Isso não obstante, é um jogo simplíssimo e por esse motivo mesmo eu gosto tanto dele.


Mas tudo na vida, estando-se atento, tem algo a ensinar. E na primeira vez em que o joguei eu percebi que jogava melhor quando não prestava atenção ao que meus adversários faziam. Quando eu estava sozinho na pista, focava somente na performance do meu carro e me saía bem. Quando outros carros estavam juntos, disputando a colocação, minha preocupação em ultrapassá-los me sabotava. Eu ficava ansioso e cometia erros que me faziam ficar para trás. Foi então que eu aprendi que eu fazia isso na vida também: ao focar no desempenho dos outros, ficava ansioso e descuidava do meu próprio. Meu objetivo, então, não era me tornar melhor que eu mesmo, e sim melhor que os outros.


Após três anos, baixei Race.io de novo e aprendi mais duas lições. De fato, aquele jogo simples, de duas dimensões de um comando, põe-se um espelho também mais fiel da minha própria vida. É mais fácil enxergar-me ali do que na complexidade das relações do mundo. Quando há poucos elementos a serem observados, a análise torna-se mais simples. E as lições foram as seguintes.


Não olhe para a concorrência. Na verdade, essa lição deveria ser formulada como foque em si mesmo. Porque só de pensar que há uma concorrência você já foi tirado do seu centro. O seu único concorrente é e sempre será você mesmo. Eu fico muito feliz quando eu jogo bem e alguém me vence com um jogo ainda melhor. Dá gosto de ver um jogador bom sendo superado por outro superior. Há beleza nisso. Mas odeio quando perco para mim mesmo, por ter saído do meu centro. A sua única preocupação deve ser em dar o seu melhor, porque é somente sobre isso que você tem controle. O que me leva à segunda lição:


Cada um tem uma velocidade. Conheço homens de 20 anos que estão frustrados porque há alguns de 17 que já são milionários. Essa frustração é totalmente descabida, mas se deve ao erro de se comparar aos outros, de olhar a concorrência e medir-se por ela. Ora, cada carro tem a sua velocidade. É impossível um Fiat Uno vencer uma Lamborghini na corrida. E assim também cada pessoa tem uma velocidade, dada a ela de acordo com as circunstâncias em que foi criada e nas quais se encontra atualmente. Nem todo mundo é um Thiago Finch, um Iagor Gonçalves. Eles são o resultado de uma configuração e circunstâncias específicas. Eu mesmo tentei ser igual a eles, mas fracassei miseravelmente, porque não tenho a mesma configuração. Acredito mesmo que nunca serei um milionário – mas aprendi também que isso não é algo que de fato eu deseje. Ser rico é só para quem realmente deseja, porque envolve muito trabalho e muito sacrifício. E eu não gosto de trabalhar.


Então, respeite o seu próprio ritmo, a sua própria velocidade, e alegre-se se você está se tornando melhor que você mesmo ao longo do tempo, porque é isso que importa.


*


Acabei de me dar conta de uma coisa. A terceira lição seria “Precisamos de desafios”, mas entraria em contradição com a primeira, porque a graça de um jogo é vencer e dominar o outro, ou seja, ser melhor que o adversário. Então, a vida só tem graça quando nos vemos em um patamar superior ao dos outros, o que anula parcialmente a primeira lição, já que é inevitável que nos comparemos e, com base nessa comparação, criemos parâmetros para julgar o nosso próprio sucesso.


O jogo se divide em arenas. Ao vencer umas oito ou dez corridas na Arena 1, você passa para a Arena 2, e assim por diante. Até a Arena 12, eu venci todas as corridas, de tão ruins que eram os concorrentes. Isso fez com que eu me sentisse entediado e não saboreasse nenhuma vitória. Quando cheguei à Arena 10 invicto, comecei a desejar perder. Comecei a implorar que surgissem competidores melhores que eu, porque nem de carro eu havia trocado ainda, e estava usando o pior carro do jogo só para ter um pouquinho mais de dificuldade. Foi aí que eu percebi que precisamos de desafios para que a vida tenha graça. Mas esses desafios se referem a atingir patamares superiores em relação a outras pessoas. De fato, se eu morasse em uma ilha deserta, qual o sentido de ter uma Ferrari? O sentido todo de ter uma Ferrari é mostrar que eu sou melhor que os outros. E isso para muitas outras coisas.


Assim, talvez devamos sim olhar para a concorrência, pelo menos para ter algum parâmetro. Mas a essência da primeira lição continua verdadeira: apesar de querermos ser melhor que os outros em sociedade, só vamos conseguir nos destacar se dermos o melhor de nós, e isso só é possível se focarmos somente em nós mesmos. Além disso, ninguém nunca é de fato igual a ninguém, cada um tendo algo absolutamente único para oferecer, seja algo pequeno, seja algo grande. Mas quando as pessoas vivem se comparando, perdem de vista quem elas são efetivamente e começam a ser cópias de cópias.


Embora eu tenha mudado de opinião no meio do texto, não vou modificá-lo para torná-lo todo coerente. Deixaria assim para dar o exemplo de que devemos mudar de opinião imediatamente assim que nos flagramos em contradição. Não tenho vergonha nenhuma disso, muito pelo contrário. É para mim na verdade um orgulho, e exibo-me como servo fiel da razão.



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